A partir da leitura do texto “Os quatro ciclos do cosmograma bakongo” escrito pela pesquisadora, musicista e arte-educadora Mo Maie, realizamos mais um encontro virtual do Grupo de Estudos do Coletivo de Capoeira Angola da UFABC. O cosmograma bakongo, que hoje inspira o símbolo escolhido para representar o nosso coletivo, foi resgatado pelo filósofo congolês Bunseki Fu-Kiau, que teve a oportunidade de vir ao Brasil por intermédio do mestre Cobra Mansa, que por sua vez transmite até hoje o conhecimento trazido por Fu-Kiau através de palestras e rodas de conversa.
Os bakongo são um povo pertencente ao tronco-linguístico conhecido no ocidente como bantu, que faz referência a uma série de etnias da África centro-ocidental, mais precisamente o território que compunha o “Reino” do Congo, e posteriormente foi dividido, dando origem aos países Angola, República do Congo, República Democrática do Congo e Gabão. De acordo com o historiador Mathias Assunção, vieram dessa região cerca de 70% dos africanos escravizados no Brasil, o que demonstra a relevância destes povos na composição da cultura do país.
O cosmograma bakongo, também conhecido como “Diekenga”, é a representação da cosmovisão desse povo, ou seja, da forma como os bakongo concebem o universo. Para os bakongo, o universo está em contínuo movimento, passando por diferentes fases, de forma cíclica no tempo. A partir dessa concepção o cosmograma pode representar elementos desde uma escala macro como o movimento do Sol em torno da Terra, até o microcosmo, como as fases da vida de uma pessoa, por exemplo.
As fases que compõem o cosmograma bakongo são Musoni, Kala, Tukula e Luvemba. Musoni é a concepção, o momento antes do nascimento, em que as coisas existem em potência, meia noite, quando o sol ainda não pode ser visto. Kala por sua vez, é o momento do nascimento, e o caminho de Kala até Tukula é o processo de crescimento e amadurecimento. Já Tukula é o sol a pino, meio dia, o auge da vida de uma pessoa, justamente onde ela precisa de mais apoio dos seus ancestrais. De Tukula a Luvemba, temos o envelhecimento, momento em que as pessoas se preparam para passar adiante o seu legado, porque logo atravessarão a linha de Kalunga, que interliga o mundo dos vivos e o mundo dos ancestrais.
Entre as reflexões que fizemos durante o encontro, estão as implicações dessa cosmovisão para a nossa cultura na atualidade. Compreendemos que algumas práticas atuais das manifestações afrobrasileiras estão de acordo com esses ensinamentos, como por exemplo a crença bakongo de que uma pessoa só morre quando seu nome deixa de ser lembrado, que é performada até hoje nas rodas de capoeira quando evocamos os nomes dos velhos mestres, nossos ancestrais, na hora da louvação. Segundo a cosmovisão bakongo, ao fazer isso, estamos evocando a presença deles novamente no mundo dos vivos. Por este motivo, enquanto houver capoeira, os velhos mestres que já fizeram a sua passagem, como mestre Pastinha e mestre João Pequeno, viverão para sempre em nossa memória e em nossa prática.
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