O livro do qual faremos um breve comentário hoje é de importância sem igual para a capoeira, pois ele possibilita conhecermos um pouco mais da história dos mestres e outros capoeiras famosos que viveram na Bahia durante o último século. Através desta leitura, é possível viajar no tempo e conhecer um pouco mais da realidade que cercava esses personagens, entre os quais: Besouro Mangangá, Aberrê, M. Caiçara, M. Canjiquinha, M. Cobrinha Verde, M. Waldemar da Liberdade, Chico três pedaços, Inocêncio sete mortes, Pedro Mineiro, Pedro porreta e tantos outros.
Mestres e capoeiras famosos da Bahia, sob coordenação de Pedro Abib, nos contempla com informações acerca dessas figuras esclarecendo alguns pontos e contando suas façanhas, como a vez em que ao ser perseguido por 11 policiais, Besouro Mangangá depois de desarma-los valendo-se da capoeira, saiu andando normalmente e ao chegar diante de um cemitério, no Largo da Cruz (Santo Amaro da Purificação - BA), deparou-se novamente com os mesmos apontando suas armas para ele. Besouro, que estava encostado numa cruz de madeira só teve tempo de abrir os braços sobre a mesma, como quem se entregava à uma execução. Tiros e mais tiros seguiram e ao final lá estava Manoel caído no chão, quando os policiais se aproximaram levaram um susto ao ver que Besouro levantou, ainda vivo e em movimentos ágeis, o viram saltar de uma ponte como num voo e fugir pela mata.
Ou ainda da vez em que um valentão foi ter com um aluno de M. Caiçara, e este disse não querer confusão em sua roda pois a mesma era em homenagem aos santos. O valentão respondeu de forma agressiva e o mestre revidou com uma cabeçada violenta chegando a puxar um punhal e sendo acalmado pelos presentes no evento.
Foto: Pierre Verger
Da capoeira e dos capoeiras de rua passamos para aqueles que fundaram e deram continuidade às academias, procurando se distanciar dessa capoeira “marginal”, querendo elevar o nome da Capoeira Angola e inseri-la em um outro contexto. Neste ponto, encaixam-se as histórias de M. Pastinha, M. João Grande, M. João Pequeno, M. Canjiquinha, M. Gato, M. Paulo dos anjos e também de M. Noronha, que foi um dos grandes responsáveis por dar início a este “movimento”. Mestre Bimba, criador da Luta Regional Baiana não fica de fora da narrativa e sua história também é contada, assim como de seus alunos Sisnando, M. Decânio, M. Ezequiel e Vermelho 27.
A aproximação da capoeira com a mandinga, as rezas e o misticismo também é abordada, principalmente nas histórias de Besouro Mangangá, M. Cobrinha verde, M. Caiçara. As rezas que os livravam das mais diversas situações, os patuás que tinham poderes de protege-los contra tiros ou golpes desferidos por facas. As magias para desaparecer e ainda os preceitos que deviam ser seguidos para que a mandinga não perdesse seu axé.
O acesso a esses e outros casos, nos leva a ver como os aspectos sociais que rondavam os personagens os influenciavam. A capoeira como forma de demonstração de valentia,afirmação e disputa de territórios, como forma de defesa pessoal e luta contra as forças opressoras. A associação dos capoeiristas com a polícia, como Pedro Mineiro e Pedro porreta. A linha tênue entre ordem e desordem, ou ainda, ordem através dos desordeiros era bem comum, a aproximação política que esses capoeiras tinham, garantiam a eles livramentos de diversas acusações ou atos que tenham cometidos. É evidente a capoeira como arma de defesa de um povo oprimido contra as heranças de um sistema de exploração escravista. Nada melhor para definir tudo isso do que com um trecho da célebre frase de M. Pastinha:
“Capoeira é mandinga de escravo em ânsia de liberdade.....”.
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